Saramago levado ao palco: a cegueira nos tempos das telas do computador

José Saramago

Jose Saramago, vencedor do Prêmio Nobel de Literatura de 1998, em sua casa na ilha espanhola de Lanzarote Source: AP

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No ano do centenário de José Saramago, o Teatro Nacional da Catalunya apresenta no Teatro Nacional de São João, no Porto, uma nova adaptação do ‘Ensaio sobre a Cegueira’, a história da cegueira fulminante que ataca os habitantes de uma cidade.


A obra foi escrita  em 1995, o ano em que foi distinguido com o prémio Camões. O livro foi publicado três anos antes de Saramago ter sido premiado com o Nobel da literatura.

Além do ‘Memorial do Convento’ e do ‘Ano da Morte’ de Ricardo Reis este ‘Ensaio sobre a Cegueira’ é um dos mais lidos e adaptados romances de Saramago.

O brasileiro Fernando Meirelles adaptou ‘Blindness’ para o cinema num filme de 2008 protagonizado por Julianne Moore com Mark Ruffalo e Gael Garcia Bernal.

Agora, nova adaptação: no ano que Saramago completaria 100 anos, o Teatro Nacional da Catalunha apresenta no Teatro Nacional de São João, no Porto, uma outra adaptação do ‘Ensaio sobre a Cegueira’.

“Essa cegueira, poderia tratar-se de uma epidemia, de uma praga, mas isso não está explicado no livro nem importa (...)”, disse Saramago.

Para ele já somos cegos. Completamente cegos quando não somos capazes de reconhecer que “foi o ser humano quem inventou algo tão alheio à natureza como a crueldade. Nenhum animal tortura outro animal”.

A nossa cegueira, expressou Saramago, afirma-se como doença crónica capaz de atravessar todos os tempos.

No texto do ‘Ensaio sobre a Cegueira’, Saramago tenta escrutinar a origem da patologia. Quer que nos perguntemos “o quê e quem somos”.

Ou ainda: porque somos assim? Já quase no fim do livro escreve: “Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa somos nós”.

Embora não tenha sido propositado a adaptação de 'Ensaio sobre a Cegueira', que agora sobe ao palco do Teatro Nacional São João, a encenação de Nuno Cardoso e produção que reúne este teatro ao Teatro Nacional da Catalunya, acontece depois da pandemia e em plena Guerra na Ucrânia.

O encenador explica: escolhemos ‘Ensaio Sobre Cegueira’ porque este livro é, de alguma forma, uma espécie de radiografia do que o homem pode ser quando confrontado com uma situação limite. Há aqui, como em grande parte da obra de Saramago, uma espécie de universalidade e uma reflexão sobre o homem, sobre a sua ética e a sua ação.

Nesta adaptação ao palco, o ‘Ensaio sobre a Cegueira’ é também uma parábola sobre o nosso mundo de redes sociais.

Não reparamos que nos fechamos numa bolha, a dos nossos contactos.

Ficamos cegos aos demais. A cegueira no telemóvel pode tornar-se uma cegueira da capacidade para argumentar, portanto uma cegueira da razão.

O texto de Saramago desenvolve-se em torno de pulsões antagónicas: a solidariedade e a desumanização; a esperança e o desassossego.

É uma reflexão sobre a alma humana. Sobre a ética, sobre a moral, sobre o amor, sobre o egoísmo, sobre a solidariedade, sobre a sobrevivência e até sobre a possibilidade de vivermos sem futuro.

Esta encenação em cooperação luso-catalã é um trabalho de vanguarda.

Serve de pretexto para chamar a atenção para o valor de um grande livro, este Ensaio sobre a Cegueira, Blindness na versão em língua inglesa.

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